segunda-feira, 7 de junho de 2010

Andragogia no Ensino Técnico Profissionalizante

Em pouco menos de 10 anos a procura por cursos profissionalizantes cresceu incríveis 86%. Hoje temos mais de 1 milhão de estudantes nas redes federal, estaduais, municipais e particulares matriculados em algum curso de ensino médio integrado (10% de todas as matrículas no ensino médio de acordo com o Inep) ou curso técnico pós-médio. São adolescentes e jovens interessados em terminar o ensino médio e ao mesmo tempo ocuparem um lugar no mercado de trabalho.

Porém, esta demanda gera um problema gravíssimo no sistema de ensino, pois estamos lidando com adolescentes e jovens focados no mercado de trabalho, mas que ainda estão na transição para a fase adulta. Como ensinar este indivíduo em fase de mudanças?

Segundo o professor Roberto de Albuquerque Cavalcanti na fase infantil somos "alimentados, protegidos, vestidos, banhados, auxiliados nos primeiros passos. Durante anos nos acostumamos com esta dependência, considerando-a como um componente normal do ambiente que nos rodeia. Na idade escolar, continuamos aceitando esta dependência, a autoridade do professor e a orientação deles como inquestionáveis." Ele continua: "A idade adulta trás a independência. O indivíduo acumula experiências de vida, aprende com os próprios erros, apercebe-se daquilo que não sabe e o quanto este desconhecimento faz-lhe falta. Escolhe uma namorada ou esposa, escolhe uma profissão e analisa criticamente cada informação que recebe, classificando-a como útil ou inútil."

Ou seja, como lidar com estudantes, oriundos de um ensino que  trabalha com crianças, em plena transição para a fase adulta?

Neste caso, temos duas abordagens que precisamos entender melhor. A abordagem do ensino que trabalha com crianças, a pedagogia, e a abordagem de aprendizagem dos adultos, a andragogia.

Ao começar a vida profissional, neste caso ao adentrar no ensino profissionalizante, os alunos esperam uma nova realidade educacional mais voltada às suas necessidades de ascensão profissional. Mas essa realidade nem sempre acontece.

Segundo Cavalcanti estes estudantes "se deparam com o mero continuísmo da educação fundamental e média: programas pré-organizados em períodos e disciplinas, conteúdos selecionados e estabelecidos unilateralmente pelos professores ou pela instituição; são forçados a se ajustarem a essa estrutura rígida, a ocupar o espaço de uma carteira que lhe é destinada como objetos da ação educacional da instituição. Devem fazer silêncio, prestar atenção à 'performance' dos professores e memorizar os conteúdos com o objetivo de responder perguntas nos testes de avaliação. Se tiverem dúvidas (e coragem), poderão dirigir perguntas ao alto do púlpito docente, é claro, com o máximo de propriedade para não serem ridicularizados por professores ou colegas de classe."

Não é raro presenciarmos professores saindo chorando da sala de aula, frustrados e desmotivados. Também não é raro vermos alunos faltando com frequência nas aulas ou revoltados porque o professor não sabe explicar a matéria. Mas porque isso acontece?

Um dos grandes motivos é a dissonância entre a "gogia" (pedagogia ou andragogia) utilizada e a etapa da vida do aluno e suas necessidades.

Então vamos entender um pouco as principais diferenças entre pedagogia e a andragogia:

Características da Aprendizagem
Pedagogia
Andragogia
Relação Professor/Aluno Professor é o centro das ações, decide o que ensinar, como ensinar e avalia a aprendizagem A aprendizagem adquire uma característica mais centrada no aluno, na independência e na auto-gestão da aprendizagem.
Razões da Aprendizagem Crianças (ou adultos) devem aprender o que a sociedade espera que saibam (seguindo um currículo padronizado) Pessoas aprendem o que realmente precisam saber (aprendizagem para a aplicação prática na vida diária).
Experiência do Aluno O ensino é didático, padronizado e a experiência do aluno tem pouco valor A experiência é rica fonte de aprendizagem, através da discussão e da solução de problemas em grupo.
Orientação da Aprendizagem Aprendizagem por assunto ou matéria Aprendizagem baseada em problemas, exigindo ampla gama de conhecimentos para se chegar a solução 

  (CAVALCANTI, 1999)

No mundo corporativo já se percebe há muito tempo as vantagens da abordagem andragógica para a consecução de resultados na empresa. Tanto que alguns autores já utilizam dessa vertente como base para programas onde empregados são responsáveis pelo seu próprio aprendizado, gerando muitos benefícios para as empresas, como: maior motivação, auto-estima, pró-atividade e responsabilidade.

No mundo acadêmico ainda andamos com passos de tartaruga, porém a máxima "nunca é tarde para mudar" encaixa-se perfeitamente aqui, sob pena de causarmos um retardamento no amadurecimento de nossos jovens e adolescentes.

Um dos pontos-chave para que esta mudança aconteça é a formação de nossos professores. Para lidar com a abordagem andragógica é preciso, além de outras coisas, transformar-se em facilitadores da aprendizagem e conhecer métodos e técnicas pertinentes. O papel do professor não é mais o daquele que professa e traz à luz o aluno, mas sim aquele que se torna o companheiro na viagem de aprendizagem do educando, mostrando-lhe e aconselhando-o sobre os melhores caminhos e animando-o nos momentos difíceis. Seguem algumas características necessárias ao facilitador segundo o prof. dr. Gilberto Teixeira (2010):

I   Avaliar suas Capacidades Pessoais como Educador:
• Conhecer-se melhor como pessoa.
• Não ignorar seus próprios preconceitos e aptidões quanto aos métodos instrucionais.
• Identificar estilos pessoais que podem adotar, mais espontaneamente.

II   Compreender a Situação Global em que o Processo Educacional se insere:
• Onde os alunos vão aplicar o que aprenderam?
• Que resultados se espera que obtenham com a aplicação daquilo que aprenderam?
• Que clima encontrarão para aplicar o que terão aprendido?

III   Saber Colocar se no Lugar do Aluno:
• Conhecer os mecanismos de compreensão e de memorização do aluno.
• Saber entender suas motivações e interesses.
• Saber sobre sua experiência profissional e pessoal anterior.

IV   Escolher os Métodos mais Eficazes para a Situação, Conhecer idéias básicas dos grandes pedagogos:
• Conhecer os diferentes métodos de ensino aprendizagem: da lousa ao computador.
• Exercer espírito crítico e selecionar os métodos que melhor se apliquem aos objetivos instrucionais.

V   Aprender a Transmitir Conhecimentos a um Grupo:
• Saber formar um grupo.
• Estabelecer uma boa comunicação com o grupo, dinamizá-lo, interagir.
• Saber fazer um grupo heterogêneo trabalhar em conjunto.
• Desenvolver um estilo de animação em grupo, eficaz e pessoal.

VI   Preparar e Montar um Ambiente Adequado para a Instrução:
• Saber preparar a instrução.
• Utilizar todas as informações úteis e instrucionais.
• Saber escolher os métodos instrucionais adequados aos alunos e ao conteúdo.

VII   Controlar a Eficácia Pedagógica da Instrução:
• Assegurar se de que os objetivos previstos estão sendo atingidos.
• Assegurar se de que os conhecimentos adquiridos estão sendo utilizados.
• Assegurar se de que os métodos empregados são eficazes.

VIII   Conhecer e aperfeiçoar se na Pedagogia para Adultos (Andragogia)
• Procurar conhecer os métodos andragógicos a como utilizá-los.
• Ter consciência de que se pode aprender com os alunos.

Quanto ao estudante, segundo Kowles, ao entrar na fase adulta, passa por diversas transformações que devem ser levadas em consideração:

• Deixam de ser dependentes para se tornarem indivíduos independentes, auto-direcionados;
• Acumulam experiências de vida, as quais serão o fundamento e o substrato de seu próprio aprendizado futuro;
• Seus interesses pelo aprendizado se direcionam para o desenvolvimento de habilidades que serão utilizadas na sua vida pessoal e profissional;
• Esperam uma imediata aplicação prática do que foi aprendido e reduzem seu interesse por conhecimentos de aplicação futura;
• Preferem aprender para resolver problemas e desafios do cotidiano, mais do que simplesmente aprender um determinado tema;
• Passam a apresentar motivações internas, como desejar uma promoção, sentir-se realizado por ser capaz de realizar uma ação recém aprendida, melhorar sua qualidade de vida, etc. Esta motivação interna é muito mais intensa que motivações externas como notas e avaliações de provas e testes.

Ou seja, o adulto se motiva a aprender aquilo que tem necessidade imediata de aprender, ou porque vai precisar ou porque sente falta deste conhecimento, habilidade ou atitude.

A base de seu aprendizado são suas experiências de vida, ou seja, o estudante vai relacionar as novas informações ao que já viveu e internalizar o conhecimento desta forma. Ao facilitador cabe harmonizar as diferenças e saber mediar a comunicação dentro dos grupos para que se troque experiências e todos saiam ganhando.

Comunicar para aprender

Na andragogia a comunicação tem papel fundamental, diferente do monólogo do modelo de educação hoje vigente. Tanto para criar um ambiente de aprendizagem, tanto porque a comunicação é a base da aprendizagem. Um aluno que sabe se comunicar aprende muito mais do que um que não saiba. O processo de comunicação não consiste em falar mais, não consiste em quantidade, mas sim em qualidade. Qualidade em saber se expressar, saber interpretar e principalmente saber ouvir. "Estatísticas demonstram que, na comunicação, uma pessoa gasta 65% de seu tempo ouvindo, 20% falando, 9% lendo e 6% escrevendo." (FAVA, 2010).

Porém, na comunicação na hora da aprendizagem o sentido que mais ajuda as pessoas a aprenderem é o visual. Veja tabela sobre aprendizagem por meio dos sentidos:

PALADAR 1%
TATO 1,5%
OLFATO 3,5%
AUDIÇÃO 11%
VISÃO 80%

Em relação ao método, quando unimos a oralidade com a explanação visual cria-se uma sinergia na apreensão do conteúdo, conforme demonstra o quadro a seguir:

ORAL 10%
VISUAL 20%
ORAL E VISUAL 65%

No entanto, na abordagem andragógica, nada melhor do que aprender fazendo.


Conforme dito por Cavalcanti (1999), Kelvin Miller afirma que adultos conseguem guardar apenas 10 % do que ouvem, no espaço de 72 horas. Entretanto são capazes de lembrar 85% do que ouvem, vêm e fazem, após o mesmo prazo. Ele observou ainda que as informações mais lembradas são aquelas recebidas nos primeiros 15 minutos de uma aula ou palestra. É por isso, que os professores na andragogia tem que desempenhar um papel diferente do modelo clássico.


Para lidar como todos estes desafios o facilitador deve antes de mais nada saber planejar a aprendizagem de um grupo. Este planejamento pode ser feito junto com os alunos de forma a torná-los mais responsáveis pelo seu próprio processo de aprendizagem. O facilitador deve comunicar aos alunos quais os objetivos do trabalho e deve procurar entender também quais os objetivos dos educandos, saber o que eles esperam, como e onde vão utilizar estes novos conhecimentos, habilidades e atitudes. Ou seja, o foco de ser nos resultados esperados por educadores e educandos.

Para Ari B. Oliveira o processo de aprendizagem se desenvolve da seguinte ordem: sensibilização (motivação), pesquisa (estudo), discussão (esclarecimento), experimentação (prática), conclusão (convergência) e compartilhamento (sedimentação).

Então, caros educadores, a mudança dessa realidade começa por você. Pela sua formação, evolução e dedicação. E lembre-se: o exemplo é uma das maiores ferramentas da educação. "O educador relapso não terá influência sobre seus educandos..." (JULIATTO, 2009)

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